1.1.08

Desmemórias

Sabe quando dá um branco? Pois é, deu um branco. De repente – coisa de duas semanas para cá - passei a não me lembrar de nada. De nada, não, minto, estou confuso; às vezes vêm alguns flashs, mas tão fora de contexto que é impossível ligá-los ao todo, como parte mínima de algo acontecido. Então fico sem saber se é alguma lembrança ou apenas imaginação, vontade de recordar um instante real, vivido. Conformo-me, pois sei que para inseri-los na realidade de meu existir pregresso, teria que haver consciência lúcida de fatos e feitos, e isso me é mesmo impossível nesse momento de minha vida. Contar como tudo começou (esse total apagão mental), eu juro, é o que eu mais gostaria. Nem recentes, nem antigas, nenhuma de minhas experiências me ocorrem. O que fiz, onde estive, com quem, o que falei, ouvi, quando, nomes... Não há nada coordenado, concatenado, nada. De lá para cá, com certa lógica de sobrevivência, venho tentando manter vívido cada acontecimento, por menor que seja, ainda que importância nenhuma tenha. Então tenho anotado tudo. Com detalhes. Percebo que as pessoas à minha volta estão estranhando este novo ser em que me transformei. Sempre com a pequena agenda nas mãos, para baixo e para cima. Para dar melhor sentido às coisas e ao seu entendimento, preciso registrar algumas estratégias que adotei a partir de então. É que (não sei se faço bem), desde o primeiro momento em que percebi essa completa ausência de memória, resolvi fugir da verdade, não contá-la a ninguém. O que narro aqui é simplesmente um destrinchar de tópicos que, como já disse, venho anotando desde 20 de março, aquela sexta-feira de sombrios tons cinzas, um dia depois de eu haver confirmado para mim mesmo, sem entender o que estava se passando, que tudo em minha mente estava zerado. Absolutamente tudo.